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domingo, 1 de fevereiro de 2015

O Processo dos Tavora

 
 
Apos ter escrito sobre temas mais actuais com temas que estao na memoria ainda de todos nos e cumprindo parte da promessa de que tencionava escrever sobre temas mais actuais volto agora a escrever sobre assuntos da area que mais me agrada, satizfaz e de facto onde me sinto melhor, escrevo entao sobre Historia e mais uma vez da Historia de Portugal.

Cumpro tambem com a promessa que fiz a uma amiga de quando escrevi a biografia do Marques de Pombal ela ter-me perguntado pelo Processo dos Tavora ja que foi Sebastiao Jose de Carvalho e Melo entao Primeiro-Ministro de Dom Jose I a tratar do julgamento e condenacao dos Tavoras a 13 de Janeiro de 1759, num descampado mas em praca publica para que servisse de exemplo para os vivos aquela condenacao e assim se visse que o Rei de Portugal nao perdoava conspiracoes e traicoes.

O episodio e considerado por mim como um dos primeiros casos em que a justica portuguesa esteve mais vista como praticando uma injustica mas apenas mais uma entre muitas de longe bem de longe as falhas de justica estao presentes na Historia de Portugal nao e apeas de agora, certamente nos dias de hoje seria um daqueles casos envolvendo os direitos humanos.                        
                                                                                                                                          

O Processo dos Tavoras refere-se a um escandalo politico portugues do Seculo XVIII. Os acontecimentos foram desencadeados pela suposta tentativa, pensa-se sem se ter a certeza, de assassinato ao Rei Dom Jose I em 1758, e culminaram com a execucao publica em Belem, tao horrenda e dura que foi considerada um verdadeiro massacre. Os membros da familia Tavora envolvidos foram espancados e depois queimados vivos Dom Francisco de Tavora e seus dois filhos, Jose Maria e Luis Bernardo. Bras Romeiro, grande amigo de Luis Bernardo tambem nao escapou. Tambem foram logo presos o Duque de Aveiro Jose de Mascarenhas da Silva e Lencastre , um dos seus criados e um irmao desse mesmo criado, e a Marquesa de Tavora, Dona Leonor que teve uma morte menos sofredora sendo condenada a morrer por decapitacao.

O resto da familia Tavora, Aveiro, Alorna e Atouguia, entre eles o Bispo de Coimbra Dom Miguel da Anunciacao, foram presos sendo mais tarde mandados libertar por Dona Maria I, que nunca viu este processo com bons olhos como a propria sentenca, acreditando sempre na inocencia dos Tavoras e restantes acusados, em prol de beneficios obscuros.

Um dos criados do Duque de Aveiro desapareceu depois da guarda ter ido a residencia do Duque de Aveiro: diz-se que se desfigurou-se com oleo de vitriolo e que se veio a tornar mendicante. Foram dadas ordens para a sua captura em toda a Europa, todos os esforcos foram em vao semelhante homem nunca chegou a ser encontrado.

Na verdade o que aconteceu nunca ficou provado que se tratasse de um atentado contra o Rei, falou-se e pensa-se que os tiros eram para um tal de Pedro Teixeira esse sim ao que parece teria um diferendo com o Duque de Aveiro, mas tambem aqui nao ha certezas algumas.

No seguimento da tragedia do Terramoto de Lisboa de 1 de Novembro de 1755, que destruiu o Palacio Real, o Rei Dom Jose I passou a viver num grande complexo de tendas e barracas instaladas na Ajuda, as saidas da cidade. Este era o presente centro da vida politica e social portuguesa.

Apesar de serem acomodacoes pouco espectaculares, as tendas da Ajuda eram o centro de uma corte tao glamorosa e rica como a de Versalhes de Luis XV de Franca. O Rei Dom Jose I vivia rodeado pela sua equipa administrativa, liderada entao pelo seu Primeiro-Ministro Sebastiao Jose de Carvalho e Melo, e pelos seus nobres. O Primeiro-Ministro Carvalho e Melo era um homem severo, filho de um Fidalgo da provincia, que mantinha algum rancor para com a velha e poderosa nobreza, que anteriormente o desprezava e alguns continuavam a faze-lo mesmo sendo ele agora o segundo homem mais importante e poderoso do Reino. Desavencas entre ele e os nobres eram frequentes e toleradas pelo Rei, que confiava plenamente em Sebastiao de Melo pela sua lideranca competente apos o terramto.

O Rei Dom Jose I era casado com Mariana Vitoria de Borbon, Princesa espanhola, e tinha 4 filhas. Apesar de aparentemente ter uma vida familiar que se podia considerar como sendo alegre (o Rei adorava as filhas e apreciava brincar com elas e leva-las em passeio), porem Dom Jose I tinha uma amante, Teresa Leonor, mulher de Luis Bernardo, herdeiro da familia de Tavora.

A Marquesa Leonor de Tavora e o seu marido Francisco de Assis, Conde de Alvor (e antigo Vice-Rei da India), eram as cabecas de uma das familias mais poderosas do Reino, ligadas as casas de Aveiro, Cadaval, Sao Vicente e de Alorna. Eram tambem inimigos cerrados de Sebastiao de Melo. Leonor de Tavora era uma mulher que se envolvia em assuntos de politica pouco usual na epoca, preocupada com os negocios do Reino, entregue a seu ver a um novo-rico sem educacao. Ela era tambem uma devota catolica, com forte afiliacao aos jesuitas, tendo como seu confessor um Padre dessa mesma ordem religiosa conhecida tambem como Companhia de Jesus, Gabriel Malagrida.
                                                                                                                 

Na noite de 3 de Setembro de 1758, Dom Jose I seguia incognito numa carruagem sem selo real que percorria uma rua secundaria nos arredores de Lisboa. O Rei regressava ao famoso acampamento de tendas na Ajuda ja de madrugada depois de uma noite de adulterio passada com a amante. Pelo caminho, a carruagem foi interceptada e atacada por tres homens, que dispararam sobre os ocupantes. Dom Jose I ficou ligeiramente ferido num braco, o seu condutor porem ficou gravemente ferido, mas ambos  sobreviveram e regressaram a Ajuda.

Sebastiao de Melo tomou o controlo imediato da situacao. Mantendo em segredo o ataque e atentado assim como os ferimentos do Rei, ele fez com que se efectuasse um julgamento rapido. Poucos dias depois, dois homens foram presos e torturados. Os homens detidos confessaram a culpa e que tinham agido segundo ordens da familia dos Tavoras, que estavam a conspirar por o Duque de Aveiro, Jose Mascarenhas, no trono (e bem possivel que a conspiracao fosse real visto o Rei so ter filhas e isso significaria que os destinos do Reino de Portugal ficariam em parte entregues ao futuro esposo de uma das princesas no caso Dona Maria I e nao se podia correr o risco de deixar acontecer o que aconteceu depois da morte de El-Rei Dom Sebastiao em que Portugal caiu na mao dos Reis espanhois). Ambos foram enforcados no dia seguinte, mesmo antes da suposta tentativa de regicidio ter sido tornada publica. Nas semanas que se seguiram, a Marquesa Leonor de Tavora, o seu marido, o Conde de Alvor, todos os seus filhos, filhas e netas foram encarcerados. Os supostos conspiradores, o Duque de Aveiro e os genros dos Tavoras, o Marques de Alorna e o Conde de Atouguia foram presos com suas familias. Gabriel Malagrida, o Jesuita confessor de Leonor de Tavora teve semelhante destino sendo igualmente preso.

Foram todos acusados de alta traicao e de regicidio. As provas apresentadas em tribunal eram simples: a) As confissoes dos assassinos executados, b) A arma do crime pertencia ao Duque de Aveiro, c) O facto de apenas os Tavoras poderem ter sabido dos afazeres do Rei nessa noite, uma vez que ele regressava de um encontro com sua amante Teresa de Tavora, presa mais tarde com todos os outros da restante familia. Os Tavoras como seria de esperar negaram todas as acusacoes mas acabaram por nao provar a sua inocencia acabando por serem condenados a morte. Os seus bens foram confiscados pela Coroa portuguesa, o seu nome apagado da nobreza e os brasoes familiares foram apagados da nobreza e os brasoes familiares foram proibidos. A Varonia Tavora e Morgadio foram entao transferidos para casa dos condes de Sao Vicente.

A sentenca ordenou a execucao de todos, incluindo mesmo as mulheres e ate criancas. Apenas as intervencoes e apelos da Rainha Mariana e de Maria Francisca, a Princesa herdeira do Trono e futura Rainha Dona Maria I, salvaram a maioria deles. A Marquesa, porem, nao foi poupada. Ela e outros acusados que haviam sido sentenciados a morte nao tiveram qualquer perdao foram torturados no que foi um verdadeiro massacre, espancados e executados publicamente em 13 de Janeiro de 1759 num descampado, perto de Lisboa, proximo a Torre de Belem.

A execucao foi apontada e vista como tendo sido demasiado violenta mesmo para a epoca, as canas das maos e dos pes dos condenados foram partidas com paus e depois queimados ainda vivos e as cinzas atiradas ao Rio Tejo so mesmo a Marquesa foi simplesmente decapitada sem mais dor ou sofrimento. O Rei fez questao de estar presente, juntamente com a sua corte, absolutamente incredula e desnorteada com o que se estava a passar. Na realidade no fundo todos viam os Tavoras como seus semelhantes ainda, mas o Rei quis que a licao fosse aprendida para que assim a nobreza nunca mais se rebelasse contra a seu Governo e autoridade regia. As execucoes podem-se considerar um verdadeiro massacre de tortura.

O palacio do duque de Aveiro, em Belem, Lisboa foi demolido e o terreno foi salgado, simbolicamente, para que nunca mais nada ali crescesse. No mesmo local, hoje chamado Beco do Chao Salgado, existe um marco alusivo ao acontecimento mandado erigir por Dom Jose I com uma lapide que pode ser ainda hoje lida. As armas da familia Tavora foram picadas e o nome Tavora foi mesmo proibido de ser citado.

O Padre Jesuita Gabriel foi garrotado ou dizem que enforcado e queimado a 21 de Setembro de 1761 e a Companhia de Jesus declarada ilegal. Todas as suas propriedades foram confiscadas e os jesuitas simplesmente expulsos do territorio portugues, na Europa e Ultramar. A familia Alorna e as filhas do Duque de Aveiro foram tambem condenadas a prisao perpetua em mosteiros e conventos.

Sebastiao de Melo foi eleito Conde de Oeiras pelo seu tratamento competente no caso, e posteriormente, ja em 1770, obteve o titulo Marques de Pombal, o nome pelo qual ainda hoje e conhecido.

A culpa ou a inocencia dos Tavoras e ainda debatida hoje por historiadores e juristas portugueses. Se por um lado, as pessimas relacoes entre a alta nobreza e o Rei estao bem documentadas. A falta de um herdeiro masculino para ser legitimo candidato ao trono era um verdadeiro motivo de desagrado para muitos, e o Duque de Aveiro era de facto uma boa opcao, talvez a melhor.

Entre os pros e contras por outro lado, alguns referem uma coincidencia: na verdade com a condenacao dos Tavora e dos jesuitas, desapareceram os inimigos de Sebastiao de Melo e a nobreza foi ou sentiu-se domada. Adicionalmente, os acusados Tavoras argumentaram que a tentativa de assassinato de Dom Jose I teria sido um assalto comum, uma vez que o Rei viajava sem qualquer tipo de guarda nem nenhum sinal de distincao numa carruagem sem selo real e que ao que parece ate lhe havia sido emprestada pelo tal Pedro Teixeira com quem o Duque de Aveiro mantinha um diferendo.

Outra pista da suposta inocencia e o facto de nenhum dos Tavoras ou familiares nao terem tentado escapar de Portugal nos dias que se seguiram ao atentado.

Culpados ou nao, as execucoes dos Tavoras foram um acontecimento devastador para Portugal. A execucao de uma familia da primeira nobreza constituiu um choque. A futura Rainha Dona Maria I ficou muito afectada pelos eventos e severidade de seu pai Dom Jose I.

O desprezo da Rainha pelo Primeiro-Ministro de seu pai foi total. Ja Rainha retirou-lhe todos os poderes que o mesmo continha e expulsou-o de Lisboa. Foi depois mais tarde emitido um decreto proibindo a sua presenca a uma distancia inferior a 20 milhas da capital ou seja 32,19 quilomentros de Lisboa.

Do total de mais de 400 pessoas entao citadas, muitas escaparam para o Brasil, sendo o caso mais conhecido um certo misterioso Frei Lourenco, que se tornou o fundador do Convento de Caraca em Minas Gerais.

Mais tarde, depois da governacao de "Pombal" o Desembargador Frei Dr. Jose Ricardo Pereira de Castro, tendo sido o relator do Tribunal revisionario deste processo ("dos Tavoras"), por sentenca de 23 de Maio de 1781, pronunciou a inocencia dos Marqueses de Tavora, de seus filhos, do Conde Atouguia, embora confirmando a culpabilidade do Duque de Aveiro. Mas tal nunca chegou a ser confirmado pela Rainha Dona Maria I.

Quase a finalizar resta-me dar a minha opniao acerca do caso. Acredito na inocencia dos Tavora em relacao a tentativa de assassinato e regicidio no atentado contra o Rei Dom Jose I praticado na noite 3 de Setembro de 1758. Acredito sim que a intencao era atingir Pedro Teixeira, o tal do diferendo com o Duque de Aveiro.

Nao acredito porem que o Duque de Aveiro e sua restante familia nao andassem a tentar conspirar contra o Rei Dom Jose I tentando trazer para o trono do Reino de Portugal o proprio Duque de Aveiro. Porem acredito que fosse de outra forma que procurassem atingir seus fins.

Caro(a) leitor(a) espero que esta cronica como as outras tenha sido do seu agrado como foi do meu escreve-la, sinto-me particularmente feliz com esta porque ao faze-la foi como cumprir uma promessa que tinha feito a uma amiga que deixou o comentario a lembrar que me havia esquecido de escrever sobre o processo dos Tavora quando escrevi a cronica da biografia do Marques de Pombal, ate a proxima.

                                                                                                                  Manuel Goncalves





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