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domingo, 1 de março de 2015

A "Deusa" da Siberia

 

Os aplausos nao paravam de se ouvir ao contrario de anteriormente enquanto estava ainda exibindo o seu corpo e realizando o seu numero para la da musica toda a enorme sala era silencio absoluto. Alguns suspiros, piropos e assobios de aprovamento quebravam a regra.

Ali havia aqueles que ali iam procurando, divertimento ou distrair-se mas se estivessem dispostos a pagar, a pagarem bem por isso tambem podiam ter prazer. Ali as regras e leis eram duras para os clientes nao podiam tocar nas bailarinas com um so dedo enquanto estivessem em actuacao, nao podiam ser incomodativos com nenhuma e muito menos ameacadores ou ate agressivos. A clientela nao era escolhida ou seleccionada mas era de classe elevada, aquele era um dos clubes de divertimento nocturno mais conhecidos da capital e muito por culpa das novidades semanais.

Jorge o dono da casa fumava uma cigarrilha e via-se apenas com um olhar que nada lhe passava despercebido. Era um homem de caracter e justo ali nao havia lugar para imigrantes ilegais, nao havia casos de raparigas estarem como sequestradas ou serem obrigadas a fazerem fosse o que fosse nos privados com algum cliente.

Naquela noite nada mais o preocupava senao assistir ao show da nova Stripper tinha sempre uma curiosidade de ver o que uma nova Bailarina lhe tinha para mostrar, havia quem insistisse em chamar as raparigas de Stripper alguns ate de prostitutas ele chamava-as e via-as como bailarinas, o striptease para ele era uma arte, uma arte de danca ou ate de provocar mas era uma arte embora reconhecesse que ele era dono de um bar de striptease, de uma casa de alterne mas as raparigas que prestavam e faziam um servico nao estavam envolvidas com outros trabalhos. Haviam strippers que sim iam para a cama com clientes mas isso ja era uma opcao de escolha de cada uma e nao dele, ali ninguem estava obrigado a nada.

Jorge estava impaciente pelo show da nova Bailarina que se intitulava como a "Deusa" da Siberia. Queria ver que "Deusa" era essa mas tinha que esperar e controlar a sua impaciencia porque nem ele o dono da casa tinha por habito quebrar as regras habituais que eram naquele sentido as actuacoes das novidades ficarem para o final da noite. Alem do mais estava satisfeito com o profissionalismo das bailarinas do Leste da Europa que tinha contratado anteriormente.

Ele sentia-se feliz com a forma como geria aquela casa em pouco tempo tornara-a uma das mais conhecidas e frequentadas da capital, os Servicos de Estrangeiros e Fronteiras admiravam a forma como ele trabalhava nao aceitando ninguem ilegal e nao lhe causavam problemas nem eles nem a policia uma ou outra rusga de vez enquando mas ao verem as raparigas com os documentos e vistos em dia iam-se embora.

Comprara aquele bar quando lhe saira o premio maior num Euromilhoes que dividira com mais um totalista, aplicara algum em poupancas, investimentos e comprara aquilo mais para nao estar em casa sem nada para fazer. Jorge vinha debaixo e subira na vida com sorte mas nunca esquecera o que era hoje e o que fora no passado. Nascera e vivera numa zona de prostituicao da capital a propria mae fizera da profissao mais antiga do mundo a sua desde que o marido, pai de Jorge, a deixara sem mais nem menos e nunca mais aparecera. Essa era a principal razao pela qual Jorge respeitara tanto aquelas mulheres e na sua casa exigia que as mesmas fossem respeitadas e nao se vissem forcadas a nada.

A actuacao da "Deusa" da Siberia como a mesma era apresentada fora um sucesso para satisfacao de Jorge era momentos daqueles que faziam a sua casa ser uma das melhores mesmo entre as melhores.

Jorge chamou-a nao queria deixar de dar os parabens a rapariga e ate desculpar-se quando viu que a musica do show dela era um dos populares hinos musicais dos shows de striptease, You Can Leave Your Hat On, de Joe Cocker ate perdeu o interesse mas quando viu que a coreografia era superior aquela vista no filme de 9/5 semanas tudo mudou de figura.

Ficou a saber que claro nao era nenhuma "Deusa" mas que era mesmo da Siberia de uma aldeia qualquer perto de Novosibirsk uma das cidades maiores da Russia. Ivana, assim se chamava a "Deusa" da Siberia era orfao de pais desde tenra idade haviam ambos morrido num tragico acidente que Ivana detestava recordar. A mesma foi enviada para um orfanato onde ficara ate atingir a idade maxima a poder estar ali, 12 anos, depois disso foi enviada para outro em Moscovo onde ficou ate completar a maior idade. Tentou completar os estudos e viver num apartamento ao mesmo tempo mas mesmo com a bolsa de estudo, as ajudas do Governo as coisas nao estavam faceis. Com o seu estatuto de orfao, com a sua historia de vida, com as melhores recomendacoes dos orfanatos e colegios internos que a mesma frequentara conseguira o milagre de obter um visa legal para vir para Portugal.

Ivana conhecia pouco de Portugal antes de chegar. Nas noticias muito raramente se falava do mesmo o que nao lhe pareceu mau de todo, podia significar que era uma boa terra, um bom pais pronto a recebe-la de bracos abertos. Comecou a aprender umas palavras de portugues, aprender sobre a cultura, a musica, a literatura, a historia os poetas em particular, simplesmente adorava a poesia e tinha outra paixa a danca.

A adaptacao fora facil, trabalhava num restaurante de Lisboa de comida russa e vivia num apartamento dividido com outras colegas todas russas com ajuda de uma comecou a frequentar as aulas de danca. Tudo custava o seu preco e estava dificil manter os estudos na universidade, a danca e ainda sobreviver com o ordenado do restaurante foi ai que uma amiga ja Bailarina do Romantic's & Love Club's Bar lhe falara do mesmo.

Inicialmente Ivana sentira pudor da ideia de ter que exibir o corpo, despir-se frente a homens e ao mesmo tempo ainda provoca-los, ela tivera uma educacao rigorosa e severa nas instituicoes para orfaos por onde passara. Porem o facto de nao ser obrigada a fazer nada com os clientes e a ideia de poder ganhar 200 euros numa noite e ainda mais as gorjetas dos clientes fizeram-na mudar de ideias e via agora isso como um trabalho como outro qualquer.

A intimidade entre Ivana e Jorge cedo cresceu e foi aumentando rapidamente. Ele desde sempre notou que ela era diferente das outras, parecia que nao estava ali apenas pelo dinheiro. Falava com as colegas, falava com ele, fazia o seu show e ia-se embora ou afastava-se das mesas dos clientes, evitava-os a todo o custo o que fazia com que a mesma perde-sse algum dinheiro com isso pois ficava sem ganhar a percentagem das bebidas consumidas pelos mesmos enquanto estivessem a conversa com ela. Apesar de tudo ele quando era preciso mantinha a distancia e tornava-se mais frio e distante, temia que ela fosse uma oportunista a procura de dar o colpe e ele era um bom partido, rico, bonito e sobretudo jovem.

Habitualmente no final de cada noite era Jorge que levava algumas raparigas a casa no seu carro mas naquela noite nao podia ser assim. Jorge tinha o carro na oficina e deslocava-se agora de mota, na sua Harley-Davidson uma reliquia original que ele possuira recentemente e o enchia de orgulho como iria encher qualquer outro apaixonado por motos. Meio a serio meio na brincadeira ofereceu boleia a uma das bailarinas mas todas recusaram excluindo Ivana que aceitara, um pouco pela curiosidade de dar o seu primeiro passeio de mota.

Tudo correu dentro da normalidade e sem novidades Jorge deixou Ivana a porta do predio do seu apartamento, mais uma vez Jorge recusou o convite de Ivana para entrar, subir e beber qualquer coisa com insistencia dela ele la aceitou ambos viriam a desejar que ele nunca tivesse aceitado, mais tarde.

Jorge saira do apartamento de Ivana achando ridiculo  facto de sempre ter recusado o convite para subir e entrar nao gostava de misturar outros assuntos com trabalho e muito menos envolver-se com bailarinas do seu bar. Jorge dirigiu-se a uma das avenidas principais de Lisboa queria tomar rumo para ir para casa. Parou num semaforo e arrancou logo apos lhe ser dada a luz verde so nao se apercebeu que um carro que vinha de uma rua transversal a avenida nao obedecera ao sinal vermelho que lhe havia sido dado vindo embater com certa forca na mota de Jorge.

Estava no hospital entre a vida e a morte as vezes mais perto de morrer do que viver. Nenhum Medico mantinha esperanca na sobrevivencia de Jorge e sobretudo numa possivel recuperacao em pleno. Duas operacoes a cabeca e por sorte o acidente nao lhe afectara a coluna vertebral o que nao lhe provocara lesoes que nao lhe permitissem voltar a andar, era visto como o primeiro milagre.

Horas, dias, semanas e ate mais de um mes que Jorge estivera em coma profundo durante todo esse tempo nunca Ivana se ausentara junto do quarto onde se encontrava Jorge, deixara tudo, ate o trabalho e a sua volta todos viam o quanto ela gostava de Jorge, iria ser uma pena que ele nao sobrevisse para saber disso.

Jorge saira do estado de coma mas os problemas no cerebro embora nao lhe afectassem as capacidades intelectuais levaram-no a de inicio no sentido da memoria a afectar as capacidades mentais, nao se recordava  de nada nem de ninguem sofrera de uma amenesia e custava-lhe a memorizar certas coisas, porem houve algo que desde sempre ele referenciava varias vezes a "Deusa" da Siberia.

Com o tempo tudo ia voltando a normalidade mas Jorge olhava de forma diferente para Ivana, olhava como sendo diferente das outras e nao como uma interesseira que queria dar o colpe no bau e tinha a certeza que ela o amava.

Um ano e pouco depois Ivana sai do jardim de infancia onde fora deixar o filho pela primeira vez e muita coisa tinha-se mudado ela era agora a esposa legitima de Jorge e ambos estavam orgulhosamente felizes com o fruto do amor que agora tinham, nao havia prova maior e mais viva que o mesmo para demostrar a grandeza de um amor como era o deles.

                                                                                                            Manuel Goncalves





1 comentário:

  1. Belíssima história.... Era bom que todas acabassem assim....:)

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