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quarta-feira, 25 de abril de 2018

O Anuncio

 

O anuncio nem ela sabia como aquele anuncio ia mudar a sua vida para sempre, o que ela ia sofrer por culpa dos erros que cometera acidentalmente com a publicacao do mesmo, as lagrimas, o ficar entre a espada e a parede, pensava ela que o mesmo a podia vir a ajudar muito naquele momento de angustia e necessidade, enganou-se.

Foram as dividas causadas pelo desemprego, a doenca do pai, a morte do irmao que a levaram ao desespero e a procurar uma solucao ainda que radical, ainda que contra os seus principios morais e esquecer-se de tudo o que aprendera de bons principios ao longo dos tempos, as licoes que aprendera ao longo da vida e a todos os bons valores e principios que os pais lhe tinham dado ao longo da vida.

Ela nao encontrava solucao corria risco de perder o carro se nao pagasse a prestacao, a casa estava prestes a ser hipotecada, nao havia dinheiro para os tratamentos do pai e ate ja faltava comida em casa e aquela carta como ultimo aviso para o pagamento da conta da luz fora a gota de agua.

Encontrara uma solucao. As outras conseguiam ela tambem o havia de conseguir, era algo de imoral mas que moral tinham os outros para a criticar, ia ganhar muito dinheiro, ia ajudar o pai, por as contas em dia, juntar algum dinheiro e organizar a vida e depois logo que possivel procuraria um emprego normal e apagaria aquele episodio da sua vida.

Nao se considerava uma Prostituta mas sim uma Acompanhante de luxo. Mesmo sem experiencia como era nova e bonita cedo comecou a arranjar clientes, clientes que ate eram regulares e fixos que marcavam encontros semanais por vezes ate por mais do que uma vez.

Ela comecou a notar que uma Acompanhante nao era apenas uma profissional do sexo, tivera clientes que a chamaram, pagaram, foram para o quarto e apenas, somente conversaram, desabafaram. Deolinda aprendera naquele momento que uma profissional do sexo era tipo uma amiga, confidente e ate Psicologa e comecara ate a ter clientes novos que a procuravam por sugestao e recomendacao de outros clientes antigos.

A unica coisa que Deolinda nao gostava era de ser algo muito incerto, havia semanas que nem um cliente tinha, havia dias que era contactada por quatro e ao quererem passar a noite ja fora obrigada a ter que escolher entre dois diferentes que a tinham contactado por email para passar a noite com ela, escolheu o que lhe pareceu melhor embora soubesse que no fim da noite tanto um como outro lhe dariam 500 euros.

As coisas comecavam a estar melhores, contas pagas, comida em casa e tudo mais o que faltava ate mesmo os tratamentos do pai, do pai que ela tanto amava, fora por ele que ela optara pela unica saida que lhe parecia haver. Na realidade talvez nao fosse a unica de facto mas realmente a mais facil.

Estava a chegar a hora de parar de seguir outro caminho, aquilo nao podia ser eterno, nao podia vir a ser viciante. Deolinda queria ter uma familia, queria ter filhos, era jovem e tinha esse direito mas se continuasse iria impedir, destruir esse sonho seria um erro. Aquilo era algo do momento e o seu sonho seria para toda a vida, familia, lar, filhos e marido e isso era o futuro, o seu futuro, a sua felicidade.

Mais um email, um novo cliente e a velha conversa do costume que ja cansava. Deolinda pretendia que aquele fosse o ultimo cliente e depois iria abandonar a historia dos convivios sexuais com estranhos, gente que nem sempre lhe parecia agradavel mas que tinha de suportar. Era certo fizera algumas amizades com alguns clientes, amizades que iria manter mas ja sem serem como clientes mas apenas amigos pessoais.

Aquele seria nao so o ultimo cliente que arranjara como a ultima vez que faria aquele tipo de trabalho. Tinha as dividas pagas, tinha algum dinheiro guardado para uma emergencia, tinha ja a oferta de um bom emprego como Secretaria para um Advogado antigo cliente embora a ganhar muito menos mas um trabalho digno e honesto, era tudo o que ela queria.

Aquele cliente pareceu-lhe mais estranho que qualquer outro ou pelo menos senao exigente mais autoritario. Parecia-lhe ser um homem de muita accao mas poucas palavras e frio. A frieza do mesmo fizera mostrar que o mesmo so se importava com o seu proprio prazer nao procurando agradar, dar prazer a ela mas isso era algo que pouco importava, desde que pagasse. O seu ultimo convivio acabou por ser a experiencia mais desagradavel que tivera enquanto Acompanhante, enquanto profissional do sexo.

Suportara o que considerou a maior humilhacao enquanto andara naquela vida, pessima despedida. O tipo so porque lhe estava a pagar considerava-se dono dela, com direitos de posse, exploracao a seu belo prazer de algo que era propriedade sua, porco, nojento, repugnante. Com aquele jamais iria estar se continuasse naquela vida. Usou-a como quis, pagou e foi-se embora praticamente sem mais uma palavra mas ela via-lhe pelo o olhar que algo ele estava a preparar, parecia-lhe adivinhar isso.

Pagara as dividas todas e ficara com algum dinheiro de reserva que tencionava investir no aluguer de uma loja de roupa toda vinda do estrangeiro, o projecto parecia garantir um negocio de sucesso mas enquanto o banco aceitava  fazer ou nao o emprestimo fora entao trabalhar como Secretaria no escritorio de advogados de um antigo cliente, um daqueles com quem tomara confianca e fizera amizade, dos poucos com quem nao se importaria de ter um caso amoroso no futuro.

Os dias corriam normalmente diferente dos ultimos dois anos em que andara a fazer os convivios, ganhara dinheiro muito dinheiro e podia ganhar muito mais mas demostrou que nao era ganaciosa, que nao queria arriscar demais, que nao era ambiciosa ao ponto de brincar com a propria saude e outros riscos.

Deolinda tivera clientes que nao tinham e nem queriam mais ninguem para sua acompanhante senao ela propria, somente ela e isso fizera-a ate em certos pontos nao se sentir feliz, nunca se sentira feliz por fazer aquilo que fazia mas o facto de ser unica para alguns, exclusiva fazia-a sentir especial.

Final do mes tinha recebido o primeiro ordenado no seu novo trabalho e estava feliz com as despesas todas pagas tinha algum ainda para viver ela e o pai ate ao fim do mes e colocar algum de parte, sentia-se feliz, mais util para a sociadade com aquela forma de viver e trabalhar do que como antigamente onde sentia que a unica coisa que conseguia era vender prazer aos clientes se eles pensavam que ela tinha prazer com eles estavam a viver uma pura ilusao.

O email era ameacador mas ela resolveu ignora-lo e esperar pelas cenas do proximo capitulo. Queria ver o que aquilo iria dar, se ia ter continuidade e ver ate onde aquilo iria por enquanto nao passavam de textos ameacadores de alguem que a conhecia, alguem que certamente era um ex-cliente.

Mostrou o primeiro e outros emails ao Patrao ele era Advogado e sabia como agir naqueles casos. Rui Eduardo aconselhou-a a esperar por algo mais, reunir provas de um acto de ameaca, chantagem e tudo mais e caso aquilo tivesse continuidade partir-se para um processo judicial. Era fundamental descobrir-se de onde vinham os emails ja que eram anonimos um bom informatico conseguia chegar ou em ultimo caso a Policia mas Deolinda queria resolver aquilo por conta propria, sem processos judiciais, sem policia pelo meio. Era preciso defender o seu bom nome, evitar escandalos e resolver a situacao da maneira mais facil quanto mais nao fosse para evitar que o pai viesse a ter problemas de saude derivado aos nervos que tudo aquilo lhe poderia trazer se fosse tornado publico.

O email daquela manha era esclarecedor e dava-lhe a entender que era do ultimo cliente com quem ela estivera antes de abandonar os convivios.

Ele deixou de se esconder no anonimato e deu-lhe uma forma, meio de ela lhe responder e contactarem-se, enviou-lhe fotos que haviam sido tiradas as escondidas sem elas se aperceber e um video de todo o momento em que haviam estado no quarto do hotel.

O que ele queria era que ela se fosse encontrar com ele novamente como fizera anteriormente e fizesse um convivio de forma gratuita, no final da noite iria entregar-lhe as fotos e o video.

Ela nao tinha escolha possivel havia o risco de ele ter mais copias e de a chantagear se manter mas de momento nao via outra saida possivel nao queria envolver policia e terceiros naquela historia, Rui Eduardo a tinha problemas a mais ainda agora que estava em fase de divorcio e queria disputar a custodia dos filhos com a ainda mulher e ele ja fizera tanto por ela.

Chegara ao parque de estacionamento do motel e viu que o nojento ja estava a sua espera e ja tinha pago o quarto, ele tinha a certeza de que ela nao ia deixar de vir e nem alugara um quarto qualquer mas a suite romantica como se isso pudesse mudar alguma coisa. Odiava aquele porco nojento que julgava que podia comprar tudo com o dinheiro dele e desta vez nem era bem assim ja que o acordo ou melhor, a exigencia, era que o encontro fosse gratuito ele pagaria apenas o aluguer do quarto no motel.

Julgava ele que podia comprar o amor dela nem sequer simpatia muito menos amor. Nunca sentira tanto nojo de alguem ou algo e so pensava em terminar tudo aquilo e ir tomar um banho, lavar-se, sentia-se suja e imunda. Queria ir embora e ja nao era embora dali do quarto mas embora do mundo, queria morrer e ele ja a estava a penetrar outra vez sem se preocupar com ela, se sentia prazer ou qualquer coisa que fosse.

O fim chegara ela considerara que cumprira a sua parte do acordo entre ambos mas ele como tipico e tradicional de chantagista queria ver se a enrolava, queria continuar a manter a chantagem por mais algum tempo ou enquanto ela se sujeita-se a isso.

Seguiu-se uma cena tipica de uma discussao com gritos e violencia fisica e antes que qualquer funcionario do motel fosse abrir a porta do quarto com a chave suplente Deolinda partiu uma garrafa e o gargalo era agora a sua arma de defesa atingiu aquele nojento na garganta e o ferimento parecia ser grave, muito sangue e ele estava em dificuldades para respirar. Deolinda via-o indo desfalecer a sua frente e comecava a entrar em panico com as consequencias que sabia que viriam ai mas ao mesmo tempo sentido um certo prazer, tivera o castigo que merecia aquele filho da puta.

Os paramedicos pouco puderam fazer senao declarar o obito e levar o morto dali o aparato que se seguiu foi o da Policia que mesmo querendo levar Deolinda detida discretamente nao o conseguiu porque um dos hospedes era Jornalista e tratou de avisar os colegas pelo telemovel do que tinha acontecido e quando chegaram no Parque de Estacionamento era uma loucura com o aparato dos restantes hospedes, curiosos que passavam e jornalistas ate de canais de televisao.

Nao podia deixar de ficar presa mas mal chegara ao Posto ja tinha o seu Advogado a espera que mesmo antes de ser contactado ja la estava para comecar a trabalhar no caso, era Rui Eduardo. O mesmo tivera conhecimento pela televisao do que tinha acontecido e estava ali para a defender e tentar quase o impossivel, livra-la de uma pena de cadeia.

Os dias que se seguiram foram um Inferno Rui Eduardo queria antecipar o julgamento, queria que o mesmo fosse o mais rapidamente possivel tinha esperanca de conseguir salvar Deolinda daquela situacao embora soubesse que aquela defesa lhe levaria muito mais tempo de preparacao.

Rui Eduardo alegava que os motivos tinham sido causados devido a chantagem do proprio falecido perante a homicida que agira descontroladamente mas em legitima defesa. No quarto o mesmo falecido que nao passava de um chantagista e oportunista tentara abusar novamente de Deolinda a verdadeira "vitima" de toda aquela situacao e o Advogado lembrava que o mesmo ja havia tido problemas com a justica por violencia, violencia domestica e abusos sexuais.

Uma das principais testemunhas da defesa era a propria ex-mulher da chamada vitima mortal que testemunhara em defesa de Deolinda e revelara cenas de terror que havia sido o seu casamento com aquele mostro, apelidara a Re como uma Heroina.

O Advogado conseguira ainda trazer como testemunhas algumas raparigas, acompanhantes que se haviam cruzado com o mesmo Mostro que agora estava morto. Todas o apelidaram com os piores sobrenomes e revelaram cenas de violencia e abusos sexuais, Deolinda teria sido uma, mais uma anonima vitima do mesmo se nao tivesse cometido aquele acto de homicidio, uma das raparigas afirmou que em boa hora Deolinda, a Re daquele julgamento, a vitima daquele o crime, a verdadeira vitima de todo aquele crime o fizera.

O Ministerio Publico pouco podia fazer mas nem pode alegar que a homicida estava ciente do crime que cometera porque Rui Eduardo conseguira reunir provas do contrario e um Psiquiatra testemunhara em defesa de Deolinda afirmando que a mesma estava a sofrer de perturbacoes mentais no momento em que cometera o crime e que essas mesmas perturbacoes tinham origem na chantagem de que estava a ser vitima.

O Julgamento terminara ali e a sentenca seria lida dentro de dois dias como por milagre Deolinda pode ir para casa durante esses dois dias embora estive com escolta policial a porta de casa e nao se pudesse ausentar da mesma.

Tanta coisa estava diferente, tudo lhe parecia triste, o pai recuperava de um AVC e parecia-lhe cada vez mais fragil. Deolinda teve a certeza de que o pai iria morrer de tristeza e dor se a mesma fosse condenada.

Rui Eduardo tinha trazido o Jantar para eles ja que ela nao podia sair para eles irem jantar em um restaurante qualquer. Ela estava nervosa, impaciente mas nao deixava de notar que Rui Eduardo sobretudo desde que se divorciara nao a largara um segundo que fosse. Fora ele que se encarregara de olhar pelo pai dela, pela sua saude e tratamentos desde que ela ficara privada da liberdade e nao sabia como podia vir a ser o seu futuro.

Deolinda nao estava confiante e nem optimista ao contrario de Rui Eduardo. Ele demostrava ter a certeza de que ela iria ficar em liberdade, mesmo que nao fosse absolvida, isso era quase impossivel, matar era um crime grave e nao importava as razoes consoante as mesmas a pena poderia ser mais leve mas a absolvicao era tarefa quase impossivel. Se era assim entao porque razao ela nunca saira em condicional antes do julgamento, era a pergunta que atormentava e torturava a sua mente e nao abandonava o seu pensamento.

Novamente na sala de audiencias, a leitura ia ser lida e era ainda tudo muito incerto e so mesmo o Juiz ja sabia qual era a decisao.

Antes do veredicto veio a velha historia e um enorme bla, bla, bla. Entendera-se que a mesma agira em legitima defesa e que se encontrava perturbada por estar a ser vitima de uma macabra chantagem provocada pela propria vitima mortal daquele crime. Deolinda no entender do colectivo de juizes agira em legitima defesa e por ser vitima de uma enorme chantagem essa era a razao pela qual jamais deveria ser condenada a uma pena maxima no entanto cometera um crime, matara uma pessoa e isso era algo grave. O colectivo de juizes decidira entao condenar Deolinda a pena de 9 anos em liberdade condicional.

Era uma sensacao estranha a de ser condenada e ao mesmo tempo de ficar em liberdade em lagrimas ficara na duvida se haveria de ir primeiro abracar o pai que fora quem mais sofrera com tudo aquilo depois dela ou se havia de ir abracar e agradecer a Rui Eduardo por tudo o que ele fizera por ela, devia-lhe agora a sua liberdade, uma enorme gratidao e ainda uma divida para pagar que nem ela sabia ainda em quanto iria ficar. Ele era Advogado, tinha tido o trabalho de a defender e ninguem trabalhava de graca.

Continuara vida que sempre tivera, era Secretaria de Rui Eduardo e sua Assistente Pessoal viviam juntos a algum tempo e ele nao quisera receber um tostao que fosse por a ter defendido dizia que nao o fizera por dinheiro ou ate por ser uma boa causa, fizera-o por amor e por isso nao havia nada para pagar.

Deolinda pensava as vezes que com o inicio de publicar um simples anuncio passara por coisas que jamais pensara passar mas tinha valido a pena por ter descoberto o que era o amor e que ainda havia homens de bem embora todos lhe dizessem que Rui Eduardo era um caso raro, era um tipo de homem com que qualquer mulher sonhava e para ela isso nao era um sonho, era uma realidade.

                                                                                                            Manuel Goncalves
















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