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sábado, 12 de janeiro de 2019

Eclipse Total



No Outono e Inverno aquilo ficara num verdadeiro deserto e quase que nao valia estar aberto se nao fosse o seu enorme grupo de clientes que ia ali para beber um copo, para um encontro e por ai a fora e nao para ir simplesmente a praia.

Com o fim da Primavera e o inicio de Verao as coisas mudavam e o areal antes deserto agora que nem se conseguia ver com os corpos bronzeados, encharcados de bronzeadores e deitados sob as toalhas estendidas, o som dos radios a berrarem as musicas que estavam na moda naquele Verao, a esplanada cheia, as turistas quase nuas sem pudor, as cervejas e gelados que ele ia servindo aos clientes e as dunas, o que se passava por detras das dunas era uma incerteza com tanta gente ali a volta havia sempre quem tinha a coragem de ir para os lugares mais escondidos dar um pouco de prazer ao corpo. Se aquelas dunas falassem muitas historias teriam para contar pensava ele enquanto olhava o horizonte que ao final da tarde ia ficando deserto.

A sua historia poderia ser igual a de tantos outros adolescentes que viviam a vida igual aos seus semelhantes. Miudos a crescerem sem saberem nada ainda da vida mas com a ilusao de que ja sabiam de tudo. Experimentavam de tudo e iam por vezes caindo em teias e abismos nos quais era tao facil entrar mas dos quais era tao dificil sair e em certos casos nao havia regresso, era assim mesmo.

Com ele nao fora diferente a unica coisa que mudara era que ele caira no abismo, caira nas teias viciantes de tudo aquilo que deram a experimentar, fizera a viagem ao Inferno mas a sua vantagem e que comprara bilhete de ida-e-volta mas o regresso nao fora facil.

Ele era ate entao o melhor aluno da turma e estava prestes a entrar para a Universidade mas aquele Verao escaldante viera a estragar tudo, a adiar os seus planos e por sorte quase que nem lhe destruiam a vida mas lhe a roubavam mesmo, estava vivo considerava que era por milagre depois de tudo o que passara.

Filho de medicos famosos os pais sendo ele filho unicos tinham o desejo que Luis Carlos viesse a ser semelhante a eles. O filho tinha que ser bem-sucedido e como tal desde cedo estudara sempre em Portugal porque nao o queriam longe deles mas fizera-o sempre nos melhores colegios particulares e sempre com as melhores notas.

A Medicina era o desejo dos pais mas sentiram que nada deveria ser forcado e esse nao era o desejo do filho que sonhava vir a ser Astrofisico os seus pensamentos estavam unicamente virados para a Astronomia, Fisica e Cosmologia e os estudos do universo em si. Nao havia maneira de o impedir mesmo sabendo que as saidas profissionais nao eram muitas mas ele so queria seguir aquela carreira e dedicar-se quem sabe a investigacao e ao ensino. Os pais deixaram que fosse ele a decidir ate porque sabiam que mesmo com pouco trabalho ou muito o filho nao ia morrer a fome porque eles ja lhe tinham garantido o futuro com o patrimonio que tinham conseguido ao longo da vida.

Aquele Verao escaldante viera a mudar o rumo de quase tudo quando na praia sentado no areal dera por si a galar aquela morena, bem torneada que nao parava de lhe fazer sorrisos. Ele nao era convencido mas era para ele que ela estava a sorrir, estavam ali so os dois naquela manha.

Aproximou-se e meteu conversa, era facil com tantos sorrisos, era facil chegar-se junto dela e perguntar-lhe se era para ele que ela sorria. O sorriso era para ele sim, ela estava cansada de estar ali sozinha e precisava de alguem ali para lhe passar o bronzeador nas costas.

Rapidamente ele e aquela morena, bem torneada e escultural estavam numa relacao de namoro, uma relacao que nao era muito bem vista pelos pais do mesmo porque embora liberais nao gostavam do filho andar com aquela hippie que ainda para mais nao tinha onde cair morta e era garantidamente consumidora de drogas. Nao proibiram a relacao mas tinham esperanca de que mais cedo ou mais tarde o filho terminasse com a mesma, seria a decisao mais acertada.

Luis Carlos com aquela namorada comecara por experimentar drogas leves mas logo o corpo comecou a exigir mais e o dinheiro da mesada deixara de chegar pelo que a solucao seria um Part-Time mas comecava-se a ver que o jovem estava diferente, alterado e ja nao tinha nada de facto a ver com aquele jovem que sonhava vir a ser como o seu idolo da ciencia e genio Stephen Hawking.

A tarde estava quente, escaldante e ele tirara o dia para ir a praia e pensar na vida, se ele queria ser tudo aquilo com que ate agora sonhara tinha que mudar de atitudes, nao podia continuar a viver daquela maneira e o melhor seria acabar a relacao com Cristina que nao o levava a lugar nenhum e aquele fogo da paixao ja estava a esfumar-se, ele queria acabar com ela mas sentia que nao era capaz de largar o vicio, pelo menos sem ajuda de especialistas, um tratamento de recuperacao era caro e iria ter que contar com o apoio financeiro dos pais que ate ja o haviam ameacado por fora de casa.

Envolvido naqueles pensamentos nem se apercebera do que estava a acontecer e das pessoas que corriam agora para junto do mar. Cristina que quisera ir dar um mergulho parecia agora estar aflita, tinha perdido o pe e estava a afogar-se. Ele correra em seu auxilio mas o mar nao parecia estar muito calmo e nem a aceitar que ele salva-se aquela hippie que lhe dera a volta a cabeca.

Nada haviam conseguido fazer o corpo fora arrastado e encontrado dias depois. Luis Carlos sentia-se destruido mas aquela tragedia reaproximara-o dos pais de quem se havia afastado nos ultimos meses. Por acordo com os pais e dele havia sido decidido que ele iria para uma clinica, fazer uma recuperacao de toxicodependencia e quando voltasse iria voltar a estudar, a formar-se e aquele episodio seria ultrapassado.

Ele fora e so queria ficar curado, queria depois arranjar um Part-Time e devolver ao Pai ate ao ultimo euro todo o dinheiro que ele iria gastar com o seu tratamento. Sabia que nao iria ser facil e que ele iria sofrer. Tudo aquilo era como um buraco negro em que podia ser facil de entrar mas nao se sabia o que iria encontrar dentro do mesmo, talvez a morte. A droga era exactamente igual, era viciante, levava a dependencia e a fazer uma viagem entre o Paraiso e o Inferno, era preciso ser-se forte e ter muita vontade para deixar aquele Inferno que era o Mundo das drogas, ele bem tinha ouvido dizer uma vez na televisao uma consumidora em plena entrevista de que a "droga era uma merda", tinha sido avisado mas nao dera ouvidos.

Nao fora de facto facil e durante muito tempo havia o risco de haver uma recaida mas ele era forte. Actualmente estava a gerir o bar da praia, alugara-o com o dinheiro que o pai lhe dera como premio de se ter recuperado e aos poucos estava a conseguir devolver ao pai todo o dinheiro que ele investira no seu tratamento. Era algo desnecessario considerava o progenitor mas ele por orgulho e senso de justica queria que fosse assim e assim que abrisse o ano lectivo queria voltar a estudar e a formar-se por conta propria.

Aquele lugar, aquela praia era dos sitios que mais amava e onde passara dos melhores e piores momentos da sua vida. Naquela praia ele aprendera a fazer Surf, naquela praia conseguira ver com seu potente telescopio as estrelas e tudo o que o Universo lhe permitia ver com ajuda daquele aparelho. Era o melhor sitio para se trabalhar mas trazia-lhe pessimas recordacoes. Fora ali que ele comecara a ficar viciado nas drogas, fora ali que ele conhecera Cristina e fora naquela praia, naquele mar que lhe estava estampado no horizonte que ele vira o corpo da mesma ser arrastado e levado para a morte.

Nem se apercebera daquela loira que faria qualquer homem perder a cabeca ter entrado no bar e estar ali ao balcao a espera que ele a servisse.

Apos a coca-cola com gelo e limao seguiu-se a aproximacao e comecaram com aquilo que aparentemente nao seria mais do que dois dedos de conversa. Ela chamava-se Diana, era inglesa, estava em Portugal a cinco anos porque o Pai era o Embaixador em Portugal do Reino Unido e ela so sonhava vir a formar-se em Comunicacao Social, queria ser Jornalista, talvez uma enviada especial do Reino Unido em portugal.

Trocaram numeros de telemovel e combinaram que teriam de sair juntos uma noite daquelas. Ele prometera a Diana uma noite qualquer tambem mostrar-lhe varias estrelas e tudo mais o que fosse possivel ver-se com o seu telescopio, Diana era mais uma das varias pessoas que o consideravam um Nerd, ele nem por isso considerava-se um simples ex-Toxicodependente ainda em recuperacao porque segundo os medicos haveria sempre o risco de uma recaida. Ele evitava sair a noite ja por causa disso e vivia praticamente entre a casa e o trabalho.

Diana passou a ser presenca e cliente habitual no bar e so ainda nao se tinha aproximado na tentativa de tentar algo mais com a mesma porque queria conhece-la melhor, imaginava como ela iria reagir a ideia de saber do passado dele e que o mesmo nao era so ter Hawking como idolo, nao era so Astronomia e Fisica. Como iria ela ficar ao saber que ele fora um Toxicodependente?

Naquela manha como ele tinha o bar quase cheio e faltava-lhe ali pessoal que habitualmente estava ali a ajuda-lo nao pode dar muita atencao e nem aceitar o convite de Diana para ir dar um mergulho e tomar um banho de sol atras das dunas, era quase que um local religioso aquelas dunas com tantas historias para contar.

Diana tinha-se ali esquecido do telemovel e ele so se apercebera mais tarde quando ouvira o mesmo a tocar. Sempre cavalheiro pediu a um Cliente de confianca, velho amigo para ficar ali uns minutos a tomar conta do negocio enquanto ele ia ver se encontrava Diana e aquele esquecimento da parte da jovem acabaria por vir a ser talvez a melhor coisa que lhe pudesse ter acontecido na vida.

Luis Carlos sabia que Diana so podia ter-se ido bronzear para o areal que ficava por detras das dunas que era como um local secreto deles e fora para la que ele se dirigira mesmo antes de ir ver se ela estava a dar um mergulho.

O silencio e calma do local que ficava uns metros afastado do mar fora cortado por um grito meio abafado e Luis correra para o local porque pareceu-lhe ser um grito nao so aflitivo mas o grito de Diana. 

O que se seguiu foi uma luta quase sem qualquer tempo de pensar Luis Carlos atacou caindo com todas as forcas no sujeito que estava a tentar violar Diana enquanto a mesma conseguira fugir chorando e descontrolada dos nervos em busca de socorro agora nao para si mas para ajudar Luis Carlos que estava medindo forcas com aquele animal que a tentara violar.

Veio um batalhao em socorro e em ajuda de Luis Carlos nao houve banhista e nem cliente do bar que ao saber do que se estava a passar nao fosse a correr em auxilio de Luis Carlos e com intencao de igualmente dar uma boa surra no quase violadar de Diana.

A surra ja estava dada e foram tantos golpes que Luis Carlos aplicara no sujeito com a cabeca que certamente o mesmo tinha ficado com o nariz partido e deixado o mesmo ficar K.O inanimado, alguma coisa ele aprendera anos antes quando praticara aulas de Defesa pessoal.

Daquele momento para frente durante dias Luis Carlos que fora um ex-Toxicodependente era agora visto como um Heroi de quem os Pais sentiam o maior orgulho e os Pais de Diana nao podiam deixar de vir-lhe agradecer e procura-lo recompensar de alguma maneira, o que ele rejeitou. Sabia que tinha ganho boa fama que apagava tudo aquilo que ele fora no passado.

Chegara a ser entrevistado na televisao porque sendo Diana filha de um Embaixador e logo de um pais que mantinha lacos diplomaticos e de amizade com Portugal a tanto tempo, ele era um Heroi ate internacional porque o caso fora noticiado no Reino Unido e ficara feliz porque com tudo aquilo as pessoas queriam dar-lhe os parabens e a clientela do bar quase que triplicara.

Era humilde demais e mantinha-se afastado do prestigio e fama que lhe queriam dar a todos o custo. Nao se sentia e nem se via como um Heroi apenas como alguem que fizera o que qualquer pessoa tinha nao apenas o direito mas dever de fazer e procurava que nada mudasse a sua rotina, o seu estilo de vida, sentia algo por Diana, algo muito especial, tinha medo de o revelar ou de ela se tornar uma outra Cristina.

Diana como por magia estava ali agora diante de si. Era a primeira vez que eles conseguiam estar sozinhos desde o ataque e logo ali no mesmo local onde o mesmo ataque se tinha dado.

Luis Carlos aproveitara a noite para levar o telescopio e observar as estrelas como sempre fazia quando lhe era possivel. Aquela era uma noite especial, tinha um eclipse total que era visivel a olho nu e ele nao o queria perder, nem se apercebera de Diana chegar so quando ela o abracara com ele virado de costas.

Sorriram, Diana queria falar abertamente com ele, agradecer-lhe e revelar-lhe de que ele salvara a sua virgindade. Nao era facil para ela falar abertamente assim ainda para mais com um homem e quando ainda estava transtornada do ataque que sofrera e da tentativa de violacao. Ela ja sabia a verdade sobre o passado de Luis Eduardo e do seu envolvimento com as drogas mas isso nao a incomodara ja mais, o passado nao importava, o presente era aquele momento e o futuro talvez comecasse dois segundos depois.

Cena linda que fora selada com aquele inicio de namoro que ja algum tempo se adivinhava com as estrelas como testemunhas e com a lua e o sol se envolvendo naquele eclipse total trocaram o primeiro beijo romantico.

                                                                                                          Manuel Goncalves














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