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segunda-feira, 21 de maio de 2018

A Grande Entrevista



Ela agora ja nao era o espelho dos noticiarios da televisao em Portugal, ja nao era a apresentadora do Telejornal e muito menos de alguns programas informativos como A Grande Entrevista e a A Grande Reportagem. Ja nao era aquela Jornalista que fora, fizera questao de o ser, Reporter em campos de batalha nas guerras que tinham havido no Medio Oriente.

Estivera retirada apos a morte do filho mas estava agora de regresso nao deixando de mudar um pouco o seu estilo e aparencia. Antigamente Sonia era uma mulher sorridente e alegre que com o maximo profissionalismo chegava a levar as suas entrevistas para lados mais comicos. Agora depois da morte do filho, filho unico, nao havia quem lhe visse um sorriso no rosto que anteriormente era considerado o rosto mais alegre e sorridente da televisao em Portugal. Estava de regresso e parecia ou talvez ate fosse mesmo uma nova mulher.

Era um regresso e esperado por muitos especialmente pelos que mais a admiravam os que a detestavam tambem esperavam por ela, era preciso era estar no activo, mostrar-se para ser criticada. Se estivesse afastada nao tinha o mesmo valor o mesmo interesse, havia tambem a polemica do boato ou realidade de que ela mesmo sem trabalhar para ser assegurada pelo canal de televisao a qual estava ligada recebia o ordenado por inteiro.

Agora que o regresso estava anunciado era preciso lanca-la de novo, coloca-la num programa de horario nobre e que fosse competir com os programas da concorrencia, decidiu-se por isso que A Grande Entrevista estaria de volta e seria novamente Sonia Sousa a apresentar o programa e a dirigir A Grande Entrevista.

Nao era facil o regresso quando ainda estava abatida com a tragedia, quando estava ainda sob o efeito de uma medicacao muito forte e com os calmantes que o Psiquiatra insistia em receitar-lhe desde o inicio do tratamento.

Comecava seriamente a pensar em deixar aquele tratamento que nao lhe parecia ser util. O Psiquiatra podia ate ser um dos melhores portugueses mas nao lhe parecia que estivesse a agir bem, ou da melhor forma. Parecia que o mesmo so queria que ela dormisse ao receitar-lhe aquilo que ela considerava doses exageradas para cavalo ou elefante. Inicialmente pareceu-lhe bem numa altura e momento em que ela queria a todo o custo isolar-se e afastar-se das pessoas a sua volta e do mundo que a rodeava e so se sentia bem a dormir, era como se estivesse morta virtualmente.

O sol, a praia, as coisas secundarias que tanto amava ainda ali estavam mas ja nao tinham o mesmo valor sem Eduardo, ele era a sua maior razao de viver, seu maior apoio e amparo, muita coisa deixara de fazer sentido e so vivia porque respirava. Vivera os primeiros tempos sem sentido para viver, faltava-lhe a vontade, a garra de outros tempos. Faltava-lhe um novo amor dizera-lhe alguem, pela primeira vez desde a morte do filho ela sorrira apos a mesma afirmacao.

Estava ali no Nordeste brasileiro por sugestao de um amigo que descobrira aquela praia deserta optima para a pratica de Surf em Tibau do Sul. Aquele final de manha era delicioso como diziam os brasileiros, o ventinho leve que fazia ajudava a suportar as ondas de forte calor que ali se fazia.

Ela estava a gostar das ferias, daquele local quase deserto onde ninguem a conhecia, onde comecara a pensar e criar ideias para o seu novo programa, olhava o seu corpo no quarto antes de ir tomar o duche da prache depois de ter vindo da praia e gostava tambem do efeito que o bronzeamento do sol fizera no seu corpo.

Ninguem a conhecia so um casal portugues que havia descoberto aquele Paraiso como ela o descobrira e que a reconheceram quando foram passar um fim-de-semana na mesma praia mas nao lhe causaram problemas, falaram com ela, comeram a mesma mesa, conviveram um pouco mas depois aquele casal em plena Lua de Mel foi-se embora para outras paragens. Ela, ela ficou e estava-lhe a custar ter de partir, o regresso para uma nova estadia de ferias era mesmo quase que uma certeza.

Olhava os rapazes a fazer Surf aproveitando o estado mar e lembrava o quanto Eduardo gostava tambem de praticar aquele desporto contra a sua vontade. Verao, Guincho, Ericeira, Praia da Nazare la estava ele, e ela, ela impaciente que ele chegasse a casa.

Sonia nao se apercebera da tipa que colocara a toalha nao muito longe do seu guarda sol embora nao faltasse espaco no areal, os surfistas estavam na agua ou mais distantes e somente ela e agora a recem chegada estavam ali naquele ponto que parecia presentia-las ou oferecer-lhes um pouco de mais sombra.

Sorriram uma para a outra e a recem chegada ficou um pouco sem saber como agir, era sempre assim quando se ia a praia sozinha e se queria passar o creme bronzeador no corpo. Sonia apercebeu-se disso e sorriu igualmente para a outra que pareceu querer chama-la com um sorriso o mesmo sorriso com que ela se oferecera para ajudar certamente era por falta de atencao dos surfistas senao o que nao faltariam era candidatos.

Lucilia, era o nome da recem chegada que estava agora ja na esplanada a conversa com Sonia que ficaram felizes por se encontrarem ali e terem tido oportunidade de se conhecerem, Lucilia era portuguesa e reconhecera Sonia pelo rosto, era apesar de afastada uma antiga figura publica de quem tanto se falava e que aparecia em tantas fotos de revistas do Jet Set, Sonia nao estava esquecida e iria renascer das cinzas logo que chegasse a Portugal. Iria voltar a ser a mesma aos poucos tinha agora o sonho tambem ja que estava fora de idade para ser mae, ja passara os 50, adoptar uma crianca mas se possivel um recem nascido ou ate mesmo pagar a uma barriga de aluguer.

Lucilia a nova amiga que acabava de fazer convidara Sonia para ir a uma festa no bar da praia onde nao iria faltar boa musica, boa comida, homens e muita diversao.

Desde a morte do filho fora a primeira vez que ela sentira o desejo verdadeiro de se ir divertir. Olhara a sua volta e por fim olhara para o ceu e era como se Eduardo, sentia ouvir a sua voz, pedindo-lhe que se fosse divertir, gozar aquilo que lhe restava da vida, chegava de tristeza e luto. Ela ainda nao morrera, nao era ainda totalmente velha ou fora de uso, era bonita e tinha o corpo e beleza de fazer inveja a muita rapariga com metade da sua idade. Sentia, sentia ali, ali mesmo a voz do filho lhe dizendo isso e pedindo que fosse sair aquela noite com a amiga e irem aquela festa.

Estavam ali as duas, tinham acabado de pedir as bebidas com que iriam acompanhar o Jantar quando um homem acabado de chegar se fizera notar mais do que os outros ate entao. Podia ser pelo facto de vir sozinho, de se vestir de uma forma ainda mais elegante ou seria pela humildade que tinha em de ir cumprimentar todas as pessoas ali presentes pessoalmente.

Ela nao se lembrara dele a partida mas ele era Pedro Luis um Escritor, compositor e Jornalista portugues que chateado com a maneira como o viam em Portugal emigrara para o Brasil onde o viam de forma diferente e onde atingira um patamar de fama muito alto, porem aquela zanga com Portugal fizera com que ele estivesse ja a mais de 20 anos sem ir a Portugal.

Pedro Luis fizera-a lembrar o falecido filho em tanta humildade que apresentava. Ela estava perante um dos melhores e maiores compositores e escritores de lingua portuguesa, as suas cancoes eram cantadas pelas maiores vozes brasileiras.

O Brasil ou pelo menos os brasileiros adoravam-no e Portugal tinha-o desprezado mas ele nunca escondera as suas raizes ribatejanas e mostrava-se magoado com a forma como fora tratado em Portugal na sua propria patria mas nunca a mostrara odiar, tinha o sonho de voltar quando tivesse a certeza de que tinha forca suficiente para enfrentar aqueles que o haviam destruido em Portugal.

Ele era um jovem Jornalista em busca de uma oportunidade certa, tinha potencial e talento mas fora mexer em coisas que nao devia. Comecou por falar nos podres de um dos homens mais influentes na imprensa portuguesa e rapidamente se viu despedido. Todos reconheciam o seu talento, o seu potencial mas nao havia jornal ou canal de televisao com coragem de se atrever a dar-lhe trabalho porque o homem que ele enfrentara era accionista em quase todos os jornais e revistas portuguesas alem de deter uma parte do principal canal de televisao privado.

A ida para o Brasil esteve longe de ser uma opcao ou oportunidade mas antes uma necessidade. Tinha de trabalhar, tinha de sobreviver e nao o podia fazer em Portugal. A censura afinal estava acessa ainda depois da queda do regime de ditadura e teve a oferta de emprego no Brasil.

No Brasil jurara a si mesmo que iria trabalhar o maximo que pudesse e ganhar poder para um dia poder voltar e destruir ou pelo menos enfrentar quem o quisera destruir a si.

A ideia era conseguir um dia implantar o seu proprio jornal em Portugal onde pudesse dizer tudo, tudo aquilo que quisesse e que noutros lados o proibiam. Um jornal, uma editora e foi dai que comecara tambem a escrever livros de romances, documentarios e depois vieram as cancoes. A fama nao tardou e a fortuna foi-se acumulando quando estava a pensar que era altura de por a sua vinganca em curso uma enorme tragedia se apoderou da sua vida, perdera a esposa e o filho num acidente de automovel a cerca de dois anos e ainda andava a tentar recompor-se e a organizar de novo as coisas.

Comecaram por se apresentar porque ele fora ao seu encontro novamente depois de a cumprimentar como fizera com toda a gente, ele reconhecera-a e nao queria perder a oportunidade de tentar conquistar a amizade dela que era justamente uma das figuras mais forte da imprensa portuguesa no momento antes do acidente que vitimara mortalmente o filho.

Tinham tanta coisa em comum ate mesmo a amargura que sentiam devido a certas tragedias que se haviam sucedido anteriormente no passado de ambos. Os dois consideravam que a morte de um filho provocava um vazio imenso, era um vazio de tal forma que nem outro filho conseguia preencher, perder um filho era como morrer-se e ao mesmo tempo continuar-se a viver, era como viver por castigo porque pela sua vontade ter-se-ia dado a vida pelo filho, teriam sido levados pela morte no seu lugar. Sonia e Pedro pensavam dessa mesma maneira.

Sem darem por conta estavam a dancar na pista do bar e tinham planeado mais tarde ir ver o luar a beira mar, era noite de lua cheia. Pedro nao era apenas um romancista era sem duvida ele proprio um homem romantico que sendo escritor passava o romantismo para as suas personagens de todas as formas possiveis e imaginarias, nos dialogos e narracao das cenas.

Era a primeira vez que isso lhe acontecera e Sonia estava quase incredula depois do passeio na praia a beira mar tinham estado a ver o luar e terminaram no quarto do hotel onde Sonia estava a passar ferias.

Nada mais estava agora na memoria de ambos depois da ultima bebida que tinham tomado no bar, apenas a quimica que os unira, a forma como se haviam envolvido e parecia que a musica do piano ainda os parecia exitar ainda mais. Podia parecer loucura mas Sonia nao quisera saber de mais nada e fora a primeira vez que fizera amor com um praticamente desconhecido, nunca se tinha sentido tao bem, conseguido ter tanto prazer com um homem como tivera com Pedro, Era a primeira vez que fazia amor com alguem desde a morte do filho.

Estavam nus debaixo dos lencois, abracados a conversa mas ela embora concentrada na conversa e a disfrutar no momento que estava a adorar nao podia deixar de pensar no passado, agora nao nas tristezas mas na parte amorosa.

Eduardo fora fruto de um amor e paixao de Verao que terminara com a chegada do Outono. Nunca tiveram mais nada mas ele acompanhara sempre a vida e crescimento do filho, sua morte custou-lhe tanto a ele como a ela. As suas restantes relacoes foram pequenos namoros e amizades coloridas nunca nada de serio, vivera de corpo e alma intensamente para o filho. Seria que aquilo que estava a sentir agora por Pedro era mesmo amor e paixao que nunca sentira por outro homem ou seria que era por ela estar mais fraca e fragilizada pela morte do filho?

Pedro acordara e abracara-a, tomou um duche e ja mais calmo e certo daquilo que nao apenas queria dizer mas que sentia.

Ele dizia que nao sabia ainda o que o futuro lhe reservava mas era tempo de voltar a Portugal. Porem fosse ali, no Brasil, fosse em portugal, fosse onde fosse, em qualquer lugar do mundo, ele queria ela do lado dele porque queria ficar com ela para sempre.

Sonia estava emocionada com aquelas palavra tao bonitas e emotivas de Pedro sentia quase vontade de chorar de alegria, aquele homem estava disposto a seguir com ela fosse para onde fosse mesmo que fosse para o regresso a Portugal, terra das suas raizes mas que o desprezara.

Em Portugal rebentara uma bomba sem grandes efeitos mas que nao deixava de ser uma noticia com impacto e que se tornara primeira pagina dos jornais. Sonia Sousa estava de regresso mas rescindira o seu contrato com o canal de estado para o qual trabalhara desde sempre. Abdicara de um contrato quase que milionario para ficar livre e poder trabalhar onde bem lhe apetecesse. Era ja sabido que ela deixara de ser funcionaria do mesmo canal mas que iria continuar a trabalhar com o mesmo apos ter criado uma Produtora onde iria ser Apresentadora de alguns programas que iriam ser apresentados na grelha de programacao do canal que ela abandonara em comum acordo.

Grande Entrevista estava de volta e ainda para mais em directo onde o publico no estudio poderia fazer perguntas e havia igualmente quem pudesse colocar questoes por telefone, email. Pedro Luis, um completo desconhecido para os mais novos era o primeiro dos convidados que Sonia Sousa iria entrevistar, para outros era justica feita o ilustre Jornalista Pedro Luis estava de volta, estava de volta a Portugal e no seu melhor.

No programa ficou-se a saber que Pedro iria criar um novo Jornal Diario onde se poderia escrever o que os outros nao permitiam e tudo faziam para manter em silencio. Corrupcao politica, desportiva, subornos, escandalos politicos, sexuais tudo seria abordado no novo jornal desde que houvesse condicoes para isso.

Pedro tinha tambem planos de criar uma editora para apostar no lancamento de obras de escritores em inicio de carreira de modo a ajudar a queda dos fortes obstaculos que era para novos escritores fazerem-se ouvir e trazer as suas obras a publico e criar uma fundacao para apoio a novos artistas e talentos das mais diversas areas com ofertas de bolsas e fundos de apoio em areas como artes e ciencias.

A entrevista correra bem e Pedro demostrara estar a altura nas respostas que dera mesmo quando o pareciam querer atacar de certo modo. Soubera sempre dominar-se mesmo sem nunca deixar de jogar ao ataque como era aconselhavel. Em pouco tempo voltara a ganhar muitos inimigos como anteriormente porem desta vez os apoio que tinha era mais forte que o odio de quem o queria destruir e calar.

Pedro e Sonia ou Sonia e Pedro sentiam que tinham agora razoes para voltar a sorrir depois de tudo que a vida os fizera perder. Ambos sentiam que eram mais do que um casal apaixonado ou socios na produtora, eram como se dizia a metade que faltava ao outro e que se tinham acabado por encontrar, eram verdadeiras almas gemeas.

                                                                                                               Manuel Goncalves



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